segunda-feira, 23 de abril de 2018

A atuação dos robôs de Bolsonaro na internet e a suspeita de laços internacionais

Reportagem de Rodrigo Rangel, Gabriel Castro e Marcela Mattos da revista Veja.


Mal tinham sido anunciados os resultados das últimas eleições presidenciais, um homem de voz mansa procurou uma empresa de Vitória, no Espírito Santo, especializada em lustrar a imagem de políticos na internet. Era início de 2015. Falando em nome do deputado Jair Bolsonaro (PSL), de quem se dizia assessor, ele queria pôr em prática uma estratégia destinada a “posicionar” o parlamentar no mundo digital. A intenção era deixá-lo popular para alçar voos mais altos nas eleições seguintes. O método: espalhar mensagens positivas no Twitter e se infiltrar em grupos de grande audiência no Facebook para difundir textos e imagens que sugerissem um movimento político espontâneo. A empresa, já comprometida com outros candidatos, não aceitou. Mas a missão de “posicionar” o deputado nas redes foi cumprida: passados três anos, Bolsonaro é um gigante digital e líder na corrida presidencial.
A tática é tão bem organizada que o pós-doutor em comunicação digital Sergio Denicoli, sócio da Exata e responsável pelo levantamento, enxerga sinais de interferência externa nessa mobilização, a exemplo do que ocorreu nos Estados Unidos na campanha que elegeu Donald Trump. Lá, uma ampla investigação apura em que medida o serviço secreto russo operou para que Trump fosse eleito. Diz Denicoli, sobre o caso de Bolsonaro: “É um trabalho que parece ser milimetricamente pensado e que, até hoje, não foi utilizado no Brasil de forma tão enfática como ocorreu em alguns países. Por isso, é possível que haja interferência externa. É um formato diferenciado em relação ao marketing eleitoral brasileiro. É um trabalho hierárquico, sistematizado e, dentro do que propõe, muito eficiente”.

Ainda não se sabe se Bolsonaro está por trás da estratégia. Consultado por VEJA, ele nega qualquer ação nesse sentido. “Tudo nosso é espontâneo, mas há muitas pessoas que trabalham para mim, que confiam em mim. Não conheço 99% delas”, diz. Resta evidente, porém, que o deputado tem se beneficiado enormemente do engajamento desse exército de perfis fake e robôs. A pesquisa da Exata mostra que, entre os perfis mais ativos do Twitter cujas postagens se destinavam a influenciar o jogo político, surpreendentes 70% atuavam em favor da pré-candidatura de Bolsonaro. “Pode-se afirmar, categoricamente, que os movimentos pré-eleitorais têm sido deliberadamente influenciados por perfis on-line criados especificamente para interferir no jogo político”, concluíram os pesquisadores.

O levantamento encomendado por VEJA considerou postagens no Twitter feitas entre 7 de setembro e 7 de outubro de 2017 — o mês imediatamente anterior à data em que faltaria exatamente um ano para o primeiro turno das eleições. O trabalho se baseia na análise de big data, que coleta, filtra e qualifica a massa de informações que circula na internet. Pela metodologia, as informações sobre determinado tema são reunidas eletronicamente e, depois, organizadas de maneira a permitir o mapeamento de lógicas de comunicação que indicam opinião e tendências dos internautas. “Assim podemos encontrar padrões de comportamento do público e perceber o engajamento em torno de um objeto, seja candidato, partido, marca ou ideia”, diz Denicoli.

No levantamento, foi analisado 1,5 mi­lhão de publicações no Twitter que mencionaram, no período estudado, os principais pré-candidatos ao Planalto. Do total, 410 000 foram difundidas pelos chamados “perfis de interferência”, que incluem robôs, perfis falsos e aqueles que são criados exclusivamente para defender ou atacar determinado político ou partido. Quase um terço de todas as menções aos pré-candidatos, portanto, estava sob influência de um movimento orquestrado. É dessa filtragem que vem a revelação sobre as forças mobilizadas para defender Bolsonaro e propagandear seu nome. Os pes­quisadores desenvolveram um sistema capaz de identificar os “perfis de interferência”. Com base em 56 critérios, definiram-se os mais ativos. Entre os 100 que mais postaram, 72 estavam empenhados em difundir mensagens pró-­Bolsonaro. São perfis que nem sempre contam com muitos seguidores (alguns têm 2 000, outros 5 000), mas que estão sempre de prontidão para replicar vídeos, fotos e textos, e também para atacar adversários. É uma tropa virtual, cuja atuação explica, em parte, por que Bolsonaro é tão maior no universo digital do que na vida real — e talvez explique, também, por que o grosso de seu eleitorado é formado por pessoas entre 16 e 34 anos, uma faixa etária particularmente ativa nas redes sociais.


Bolsonaro

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